Friday, September 02, 2005

Inquietação

Kandinsky


Que posso?...
...ouço o dia descompassado e a pulsação enviesada das minhas veias. Vejo a vida em potência nas vilosidades das horas... mas é tudo tão longe!
O que sou e o que sinto são apenas abismos escavados no meu peito! Nada mais. Não há amplitudes sentimentais ou possessivas em que o mundo se retese. Eu sou só eu. Sem a posse circunflexa das certezas, dos afectos ou das coisas. Até do meu corpo. Porque o meu corpo não sou eu. O meu rosto,os meus membros, as minhas vísceras, o meu ventre, o meu sexo. Uma corrente electrónica imaterial nos interstícios da terra? Uma força, um espírito, uma alma que se lambuzou na tabela periódica para poder espernear?... o quê?
E depois de ser... o que serei? Quando o meu corpo se cansar de ser um capricho táctil, quando o tecido uno de mim ceder à lise temporal e se dissolver no Universo... NADA?... mas como posso estar aqui agora e ser e ver e doer-me, e amanhã implodir-me de nulidade e não estar, não sentir, toda inflexa empapada de morte?...

3 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Obrigado pelo link que vou retribuir já de seguida.

Gostei do reloijo!

12:50 AM  
Blogger dulcehelenaguerreiro said...

"empapada de morte" é cruamenre real. Imaginava eu que trabalhando a Rosário com vida e com morte, pudesse mais fácilmente desdramatizá-las a ambas. Vejo que é ingenuidade pensar que o facto de ver a morte mais de perto, possa fazer com que nos habituemos à ideia.

12:33 AM  
Blogger Rosario Andrade said...

Ola!
Lidar com a morte habitua-nos sobretudo a distanciarmo-nos das pessoas, a ter uma atitude puramente analítica em relação ao doente, para nao criar laços, embora às vezes seja difícil. Mas não nos habitua à mortalidade...
Para algumas pessoas é fácil, acreditam que voltam como pássaros, ou vacas ou que ressuscitarão não sei quando. A questão da mortalidade é mais complicada para quem não tem deuses...

1:42 AM  

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